8 de novembro de 2010

Fim do "Noites de Utopia"

“Talvez um dia perceba que toda a dor, todas as lágrimas, todos os poemas e textos, tudo teve a sua razão de ser, tudo fez parte da minha caminhada para atingir a perfeição que todos desejam.”

É com esta frase que dou início ao último post deste blogue. Não sou perfeito, nunca fui, nunca serei nem nunca quis ser, tal como as palavras que escrevi e que aqui partilhei. Nunca – nunca – me considerei escritor, nem de perto nem de longe. Escrevo por necessidade e não a pensar nas pessoas que poderão ler o que escrevo; escrevo sobre aquilo que me apoquenta e que tenho que transformar em palavras; escrevo porque isso me faz bem. Nestes quase 2 anos passei por muita coisa: tive momentos de pura felicidade e momentos de pura angústia, e tudo isso foi perceptível naquilo que fui postando aqui. Muitas vezes preferi revelar como me sentia através dessas palavras em vez de responder àqueles que me perguntavam como estava. Não o consegui evitar, não me arrependo e, provavelmente, continuarei a ver na escrita o meu melhor “ouvinte”. Sou assim.

O que as palavras me dão, aquilo que me faz continuar a escrever constantemente, só eu compreendo e nunca ninguém será capaz de perceber. É esta a verdade que quis ignorar, e foi esta a verdade ignorada que me fez publicar poemas, textos e cartas. Talvez tivesse à procura de alguém que compreendesse, alguém como eu, alguém erradamente imperfeito como eu. Infelizmente ao revelar o que escrevia nada mais fiz do que mostrar as minhas fraquezas a todos os que as quiseram ver…agora entendo isso.

As “Noites de Utopia” continuarão a ser “noites de ilusão, noites de dores e lágrimas, noites de sofrimento e tristeza, noites que estão condenadas a esbarrar na realidade”, assim como serão “noites de esperança, noites de sorrisos e fantasias, noites de alegria e perfeição, noites que serão sempre as grandes responsáveis por eu continuar a acreditar no destino, na felicidade e, acima de tudo, no amor.” No entanto a partir de hoje essas noites serão apenas minhas e as palavras que nelas escrever ficarão guardadas para que ninguém possa achar-se capaz de entender o seu significado.

O blogue “Noites de Utopia” continuará online mas nunca mais será actualizado. Aqui ficarão memórias que nem o tempo nem a raiva poderão apagar; aqui ficarão palavras que nunca ninguém entendeu; aqui ficarão sentimentos que de tão fortes não serão alterados pelo tempo. Aqui, no “Noites de Utopia” ficarão quase dois anos da minha vida, ficarão lágrimas e sorrisos, e ficará, acima de tudo, o arrependimento por um dia ter criado este espaço.

O autor:
Daniel Paiva

4 de novembro de 2010

Carta a um Amor Secreto n.8

Será que o que sinto não passa de uma ilusão de sentir? Será que todas as minhas palavras, todas as vezes em que te elevei a divindade, fizeram apenas parte da minha necessidade constante de me fazer passar por alguém que nada vale? Será que tudo isto é uma farsa e que o seu final, se algum dia chegar, apenas será causado pelo surgir de outra farsa equivalente? São perguntas que me apoquentam nestas noites, estas iguais à de hoje, estas em que não consigo fechar os olhos sem ver a tua imagem.
Respiro-te, é essa a verdade. Respiro-te enquanto durmo e sonho contigo a meu lado, respiro-te quando anseio encontrar-te, respiro-te quando tento convencer-me de que não te quero ver. E o que tu fizeste para te tornares o meu oxigénio?, pergunto-me eu invariavelmente, quando sei, demasiado bem, que não fizeste nada. Eu tratei de fazer de ti “tudo”, tratei de fazer mim “nada” e tratei, se é que isso não estava já tratado, de fazer nós “miragem”. Mas hoje, nesta noite em que não quero adormecer, pergunto-me se não será esta “miragem” aquilo que me faz sorrir todos os dias, aquilo que me faz escrever todas as noites, aquilo que me faz ter a certeza, mesmo não tendo, de que tu lês as minhas palavras.

3 de novembro de 2010

Olhares de Compaixão

Olhas-me como quem olha quem quer amar,
E nunca eu vi um olhar tão expressivo assim,
Revelas-me tudo no teu silêncio com pesar,
Como que pedindo perdão por não me amares a mim.

Enquanto eu tento parar de te desejar como desejo,
Enquanto luto contra mim próprio para te esquecer,
Tu olhas-me assim, como quem olha quem quer amar,
Fazendo-me sorrir ao mesmo tempo que me fazes chorar,
Obrigando-me a mais um poema ou uma carta escrever
E afastando o final que cada vez menos prevejo.

Olharás mais alguém como a mim me olhas?
Será que alguém algum dia mexeu tanto com o teu coração?
Guardarás todas as palavras, todos os poemas…todas as folhas?
Ou limitar-te-ás àqueles olhares, pura compaixão?

1 de novembro de 2010

Um conto: "Gritos de um Rapaz" [completo]

Sentado, Luís pensava nos últimos dias da sua vida. Tudo o que tinha conquistado ao longo dos anos, tudo aquilo pelo que ele tinha lutado e esgotado as suas forças estava agora destruído. Tudo não passava de uma memória que parecia tão mais antiga do que realmente era. A verdade é que tudo se desabara à apenas uma semana, a semana mais longa e dolorosa da sua vida. E ali a seu lado estava Pedro, sorridente, entretido a contar as cadeiras da sala de espera.
Pedro tinha 24 anos e sofria de esquizofrenia desde à aproximadamente 2 anos e meio, exactamente a altura em que a mãe de ambos começou a ter crises cardíacas. O pai tinha-os abandonado ainda eles eram umas crianças. Luís, com mais 5 anos que Pedro, era um rapaz saudável e, até há bem pouco tempo, bem sucedido. Por vezes ele desejava ser como o irmão, gostava de não se dar conta do mundo que o envolvia, gostava de não ter noção de nada do que estava a acontecer. Mas o destino não o tinha presenteado com tal sorte.
E agora ali estava ele, recém despedido por não ter concretizado o negócio que lhe custou a “cabeça”, recém falido por toda a despesa a que o estado da mãe obrigava. Há uma semana atrás, com apenas 53 anos, ela tinha tido uma crise cardíaca mais grave que todas as anteriores e tinha sido obrigava a ficar internada. Segundo os médicos a única solução era instalar um quádruplo bypass, implantação essa perigosa, cara e possivelmente fatal.

Enquanto a cirurgia acontecia, Luís não evitou pensar em como seria se a mãe falecesse. O que seria de Pedro? Não tinha dinheiro para pagar um internamento ao irmão, logo teria de se assumir como responsável por ele. Mas como conseguiria reconstruir a sua vida com o irmão a seu lado? Esforçou-se por afastar aqueles pensamentos de si.
Passadas 4 horas o médico anunciava o fim da operação. Segundo ele tudo tinha corrido pelo melhor, no entanto a mãe apenas estaria pronta a receber visitas na manhã seguinte. Decidiu ir para o apartamento com Pedro, precisava de descansar. Nas últimas 5 noites não tinha dormido mais que 3 horas. Ia tomar um comprimido para dormir e talvez conseguisse deixar de pensar em tudo aquilo.
Na manhã seguinte, às 9h Luís acordou, surpreendido por ter conseguido dormir tantas horas. Levantou-se e procurou por Pedro. Não havia nem sinal dele. Ligou ao porteiro e ele disse-lhe que Pedro tinha saído duas horas antes. «Só pode ter ido para o hospital.» pensou Luís, e mal lá chegou teve a péssima sensação de que estava certo. O hospital estava repleto de carros de polícia. Luís rompeu por entre a multidão e mal chegou à porta viu Pedro, algemado, a ser escoltado por dois agentes.
- O que fizeste Pedro? – perguntou ele sem se dar conta de que tinha feito a pergunta aos gritos, concentrando as atenções todas nele.
- Ela estava a sofrer mano, tinha de a deixar descansar! – respondeu calmamente Pedro.